Casa Do Mel Bioápis (Gravatal, SC)

“Relações solidárias fazem com que a gente mantenha um nível mais elevado de humanidade e a vida valer a pena”

Nosso entrevistado desta semana é o agricultor familiar orgânico Adilson Maia Lunardi. Ele é quem forneceu os tomates que compõem a sua cesta. Adilson começa nossa conversa destacando “a importância de que o movimento se nutra das histórias das pessoas que produzem, das pessoas que comem e das pessoas que doam”, porque ele “só funciona tendo todas as partes envolvidas”. Vamos, então, a sua história.

Gerações, possibilidades e opções

Os Lunardi são agricultores familiares há gerações, em Gravatal. Quando a Unidade Familiar de Produção era tocada por Lourenço e Albertina – os pais de Adilson, ser agricultor no Sul do estado significava, quase em 100% dos casos, ser fumicultor. Ou seja, plantar e secar tabaco para entregar às indústrias fabricantes de cigarros. Adilson viveu essa realidade em sua infância e adolescência. Nos anos 1990, contudo, passou a ficar muito difícil sobreviver plantando fumo. Preços muito baixos e maior rigor na classificação das folhas penalizavam os agricultores. Como Lourenço era um apicultor apaixonado, o mel apareceu como possível alternativa. As vendas locais junto a turistas que frequentavam os hotéis de águas termais de Gravatal pareciam promissoras. O “cerco da vigilância sanitária” e as “pressões para ter uma estrutura adequada” dificultaram, contudo, a comercialização. Foi quando surgiram as propostas de filiação à Associação dos Agricultores Ecológicos das Encostas da Serra Geral (Agreco) e de construção de uma “pequena agroindústria”. Assim, em 1999 se deu a “conversão” à agricultura orgânica. Anos depois, para diversificar e para atenuar os problemas de renda ligados às oscilações da produção do mel (muito dependente das condições climáticas de cada ano), a família investiu no plantio e no beneficiamento do tomate. Hoje, com a companheira Ana e com a “bambina” Antonella, Adilson toca a Unidade Familiar de Produção. E, nessa condição, ele fala desse período em que a Covid-19 passou a influenciar o dia-a-dia de todos.

Os impactos da pandemia

Adilson Lunardi conta que “a pandemia bagunçou toda a rotina”, seja no “trabalho na roça”, seja na atuação dele na CooperAgreco, seja pela “filha não ter escola” e – privilégio de quem vive no campo – “ficar solta na propriedade”. Relata, ao mesmo tempo, que “2020 foi um ano de boa produção”. E comenta: “quando a safra vem boa, a gente agradece e trabalha o quanto for preciso para dar conta.” O grande problema ligado à pandemia foram “os aumentos sucessivos dos preços de potes, tampas metálicas, rótulos e embalagens. E, pior, esses materiais ficaram difíceis de se conseguir”. Houve, assim, a necessidade de adequações e uma grande pressão dos custos sobre a renda da família.

“A relação com quem come os produtos de qualidade que produzimos e que também comemos”

O primeiro ponto sublinhado por Adilson é o fato de “estar longe da cidade”. “Com isso, a gente tem uma dificuldade de colaborar com quem precisa, o que gera uma certa angústia”. Ele traz à memória: “Durante um tempo, fornecemos merenda escolar orgânica, em um programa do Governo do Estado. Depois de um período, o então Governo Federal investiu muito em um programa de compra antecipada e doação de alimentos. Nós fazíamos a produção, o governo adquiria e nós mesmos realizávamos as entregas das doações em comunidades carentes da Região da Grande Florianópolis”. As mudanças nas políticas públicas geraram, porém, a descontinuidade desses programas. “Aí, o que pagou as nossas contas foi a comercialização, especialmente em super e hipermercados. Ora, isso gerou um distanciamento em nossa relação com aquelas pessoas que moram em comunidades periféricas e que não podem pagar por nosso produto orgânico comercializado nesse circuito de vendas”, prosseguiu Adilson. Para destacar, então, o papel do Orgânico Solidário: “O Programa traz de volta essa possibilidade de vermos nossos produtos de extrema qualidade chegando a pessoas que não poderiam comprá-los”. E, com um tom reflexivo, completa: “Por isso, a beleza do Orgânico Solidário e a satisfação em poder dele participar”. Para arrematar, de bate-pronto: “O momento que vivemos é de total incerteza. A única certeza é a de que o que vale são as relações pessoais e solidárias. São elas que fazem com que a gente mantenha um nível mais elevado de humanidade e a vida valer a pena.”

Imagem 1: Lourenço (pai),  Cecília (sobrinha), Adilson,  a filha Antonella e o Felipe (sobrinho) (Arquivo pessoal)

Imagem 2: “Frutos” da família Lunardi (Arquivo pessoal)

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